O actual modelo de capa da Irmandade de São Roque foi desenhado no ano de 2007, sendo produzidas em tecido preto mate (satifon), num modelo sóbrio de capa preta, longa e roçagante ao chão e com capuz (sem mangas e abertura para braços). Sobre o lado esquerdo, é aplicado o Brasão de Armas da Irmandade da Misericórdia e de São Roque de Lisboa, criado igualmente, no mesmo ano, pelo Mestre Heraldista José Benard Guedes.
O modelo da capa recebeu influências profundas da representação iconografia do nosso Santo Patrono - São Roque. As vestes do Santo constituíram para as diferentes comunidades de São Roque no mundo, um modelo poderosíssimo para a concepção da representação das insígnias, capas e Brasão de Armas das diferentes confrarias e irmandades.
Desconhecemos se as capas dos primeiros 72 irmãos fundadores da Irmandade de São Roque de Lisboa seriam realizadas em tecido ricos, próprias de uma classe abastada de homens honrados, ou se confeccionadas em tecidos mais grosseiros (lã, estopas) e de cor neutra e despojada, mais apropriados a uma conjuntura de grande mortandade, onde as obras de caridade e de espiritualidade praticadas deveriam ser ministradas por homens discretos, identificados por uma capa (com gola? sobrecapa/romeira? capuz? chapéu?) e cuja atenção se centralizava nos fiéis que acolhiam.
No século XIX, temos registos de pedidos de empréstimo de capas para os momentos celebrativos, destinados aos Mesários, Mordomos, Procuradores e Irmãos, sendo pagos o aluguer e o transporte, entre outros, dos empréstimos solicitados, designadamente, à Irmandade de Santa Cruz e Passos do Desterro e à Irmandade de Ofícios da Antiga Casa dos 24, da Igreja de São José dos Carpinteiros (esta última a quem foram solicitadas, em 1833, 36 capas), além de outras capas e opas (veste sem mangas e aberta à frente). Em 1863, a Irmandade de São Roque adquire um conjunto de «quatorze capas pretas, sendo cinco de sarjão orleans, uma de pano, e oito de sarjão».
No século seguinte, na década de 1950, surgem encomendas de novas capas em tecido de «sarjão preto mate», encontrando-se alguns exemplares no acervo da Irmandade. Trata-se de capas em tecido grosso, sem forro, de formato semi-circular e sem muita roda, unindo na frente com um colchete e/ou com um cordão, de pequenas e médias dimensões, rematado superiormente por uma pequena gola rectangular. Sobreposta à capa, era utilizada uma «gola» branca de duas pontas, também designada de «cabeção branco» (1960). Esta gola é formada por duas tiras verticais, em tecido de cambraia, plissado e rematado exteriormente por uma pequena renda. A origem deste adereço não está determinada, mas o formato tem alguma semelhança com a gola utilizada no traje dos magistrados, o que não será totalmente estranho, pois o Juiz foi o mais alto cargo da Irmandade/Confraria, até à revisão estatutária de 1979.
Irmandade de São Roque na Procissão do Senhor dos Passos, década de 1950
Em 1961 existiam 330 capas e murças roxas e 51 «capas e golas de S. Roque». No ano seguinte foram feitas mais 14 cabeções para mesários.
É de 1963 a primeira encomenda de 10 capas de seda para os Mesários, realizada pela modista Suzete Fernandes (AH/IMSRL – Doc. 30, cx 31). Esta capa tem gola arredondada (com forro em cetim lilás) e é unida no pescoço por um cordão, com argola e remate em borla franjada.
Em finais da década de 1990, sob a Provedoria do Padre António Reis S.J., o formato da gola é transformado: passou a uma só ponta de formato rectangular e mantendo o plissado e o remate em renda. Esta mudança foi fundamentada na suposta dificuldade em confeccionar o antigo modelo, passando a um mais simplificado.
Irmãos da Irmandade da Misericórdia e de São Roque, 2006
Sabemos que algumas Irmandades de São Roque (como por exemplo a Real Irmandade do Glorioso S. Roque dos Carpinteiros de Machado, criada em 1570, extinta civilmente em 1927 e incorporada por fusão na nossa Irmandade da Misericórdia e de São Roque de Lisboa, no ano de 2011) optaram por modelos de Murças e Romeiras em tecidos de cor negra, «murças pretas com os seus Capelinhos» e nas «murças traziam bordadas as Armas Reais», o que demonstrava que a Irmandade gozava de protecção Real».
Murça preta com seus capelinhos, Real Irmandade do Glorioso São Roque dos Carpinteiros de Machado (acervo do Museu Nacional de Arte Antiga)
No caso da Irmandade da Misericórdia de Lisboa (instituída em 1488 e incorporada por fusão, em 2011, na Irmandade da Misericórdia e de São Roque de Lisboa) sabemos que usava uma capa com romeira (cabeção ou sobrecapa), como se pode ver na fotografia que acompanha o artigo, de 1908, de Victor Ribeiro, sobre a Bandeira de Misericórdia de Lisboa nos Enterros Reais.
Irmãos da Misericórdia de Lisboa nos Enterros Reais (Victor Ribeiro, in Serões, n.43, 1908)
Helena G. Pinto
Investigadora